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Mindfulness e comportamento alimentar: saindo do piloto automático

Saiu de casa para visitar um familiar e acabou, sem querer, pegando o caminho para o trabalho? Comeu e nem percebeu o gosto, o aroma, as sensações provocadas pelo alimento?

Situações como essas costumam ocorrer quando estamos operando no "piloto automático”, ou seja, quando nossa atenção não está voltada ao momento presente e sim vagando em outras direções (passado ou futuro).

Conforme já falamos anteriormente aqui, existe uma alternativa para quem busca sair do modo automático: a prática de Mindfulness (ou atenção plena).

A prática de Mindfulness pode auxiliar os indivíduos a se conectarem com suas experiências internas (como a fome), diminuindo assim sua reatividade e as chances de se alimentarem por motivos emocionais (Kristeller e Wolever, 2011).

Conforme Sairanen et al (2015), as habilidades desenvolvidas com a prática da atenção plena estão relacionadas a um comportamento alimentar mais intuitivo, baseado nos sinais corporais e na autoconfiança para determinar quando e o quanto comer.

Para que fique mais claro e prático para você, mostraremos alguns conceitos do Mindfulness que se relacionam com o comportamento alimentar.

1. ATITUDE DE ABERTURA E CURIOSIDADE:

Situações já vivenciadas ficam registradas na nossa mente e, quase sempre que outra situação semelhante acontece, agimos ativando essa memória do passado e realizando as mesmas conexões cerebrais (Williams e Penman, 2015).

Segundo o TCME (The Center of Mindful Eating, 2014), a atenção plena cultiva a possibilidade de libertar-se de padrões reativos habituais. A prática de Mindfulness permite que você comece a observar seus pensamentos, encarando-os com curiosidade e abertura, sem se apegar a eles. Uma atitude “mindful” é viver cada momento como um novo momento, uma nova experiência. E isso, é claro, é aplicável ao comportamento alimentar.

Você pode se observar e não precisa repetir sempre os mesmos padrões alimentares. Se você exagerou num rodízio, por exemplo, não significa que isso acontecerá todas as vezes em que for a esse tipo de restaurante. Cada experiência alimentar é única; cada mordida de um mesmo alimento pode ter um sabor diferente.

2. NÃO JULGAMENTO, GENTILEZA E AUTOCOMPAIXÃO:

Uma das premissas do Mindfulness é o não julgamento. Quando você pausa para praticar, é normal que o pensamento se distancie do foco atencional algumas vezes. Quando você perceber que isso aconteceu, basta direcionar novamente a atenção para o momento presente, sem se criticar ou julgar, com autocompaixão.

No Mindful Eating (comer com atenção plena) não há espaço para julgamento (Alvarenga et al, 2015). A imposição de regras rígidas de alimentação gera culpa quando julgamos determinados alimentos, separando-os entre “certos x errados”, “permitidos x proibidos”. Ao julgarmos a escolha alimentar, não estamos tendo uma atitude “mindful”.

Existem outras situações comuns a serem consideradas:

  1. Quando não respeitamos o sinal da saciedade e comemos até nos sentirmos desconfortáveis.

  2. Quando tomamos consciência de que o motivo de estarmos comendo é emocional.

Em ambos os casos, procure não categorizar a experiência alimentar como “boa” ou “ruim”, e seja compassivo consigo mesmo; isso certamente trará mais clareza para enxergar a situação. Do contrário, se punir ou se julgar poderá fazer com que você se sinta ainda mais desconfortável.

3. ATENÇÃO AO MOMENTO PRESENTE

Quando não prestamos atenção ou ignoramos algo que estamos vendo, tocando ou comendo, para o nosso cérebro é como se esse algo não existisse (Alvarenga et al, 2015). Se comemos distraídos (mexendo no celular ou assistindo televisão, por exemplo), não conseguimos saborear de verdade o alimento; provavelmente isso não trará satisfação e logo sairemos em busca de mais comida.

Mindfulness é estar consciente de seus pensamentos, emoções e sensações físicas no momento presente (The Center of Mindful Eating, 2014). E como aplicar esse conceito de atenção ao momento presente na hora de se alimentar?

Antes de comer você pode se perguntar:

- estou com fome? Se sim, qual é o nível dessa fome?

- em qual parte do corpo essa fome se manifesta?

- qual a minha necessidade nesse momento? De quê eu preciso? Quais são as minhas emoções?

Não negue nem julgue o que aparecer como resposta. Durante a refeição, procure explorar todas as sensações, prestando atenção até mesmo no barulho de cada mordida. Descanse os talheres entre uma garfada e outra, se for o caso. Respire fundo. Se dê esse tempo. Aproveite. Tente deixar o celular e a televisão para outro momento. Perceba se seu foco atencional está no alimento ou se o pensamento está passeando em outras direções. Note se o alimento está te deixando satisfeito, e quais sensações físicas ele promove. Não parece mais agradável e satisfatório se alimentar assim?

Se quiser entender ainda mais sobre o assunto, não deixe de assistir a esse vídeo do canal “Eu Vejo”, da jornalista Daiana Garbin. Ele mostra um exercício prático de comer com atenção plena e conta com a participação da nutricionista Ana Carolina Costa.

É importante esclarecer que o Mindful Eating não é mais uma dieta. Se você se impuser regras de tempo de duração da refeição, por exemplo, isso se tornará uma obrigação e fugirá do propósito do Mindfulness, pois haverá crítica e julgamento. Você pode começar com uma refeição por dia e logo perceberá que, com a prática, torna-se cada vez mais fácil e mais agradável.

Referências:

ALVARENGA, M. et al. Nutrição Comportamental. Barueri, SP. Manole, 2015.

KRISTELLER, J. L.; WOLEVER, R. Q. Mindfulness-based eating awareness training for treating binge eating disorder: The conceptual foundation. Eating Disorders 2011, Vol. 19(1).

SAIRANEN, E. et al. Psychological flexibility and mindfulness explain intuitive eating in overweight adults. Behavior Modification 2015, Vol. 39(4).

THE CENTER OF MINDFUL EATING. Why Mindful Eating? Disponível em: http://thecenterformindfuleating.org/Resources/Documents/TCME_2014_introbrochure.pdf. Acesso em 16 fev 2017.

WILLIAMS, M.; PENMAN, D. Atenção Plena Mindfulness: como encontrar a paz em mundo frenético. Rio de Janeiro: Sextante, 2015

Nutricionista comportamental em Marau (RS) e região


Colaboradoras

Organizadoras

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