Como os pensamentos influenciam nosso comportamento alimentar?
- Rafa DallAsta
- 11 de out. de 2017
- 3 min de leitura
“Já sei que quando vou àquele rodízio, eu como até passar mal”.
“Se tiver uma barra de chocolate em casa, com certeza eu vou querer comer inteira, de uma vez só”.
E eu te pergunto: SERÁ?! Será que isso é uma verdade, uma realidade (fato)? Você ainda nem está vivendo essas situações, como já sabe que isto vai acontecer? Ou será que são apenas condicionamentos seus, que acabam se confirmando devido ao sentimento que é gerado pelo pensamento automático?
E se você pudesse observar e contestar pensamentos que surgem automaticamente? Já parou para refletir que, muitas vezes, nossas experiências acabam sendo efeitos externos de nossos pensamentos?

Segundo Alvarenga et al (2015), os pensamentos automáticos passam rapidamente por nossas mentes quando estamos em meio a situações conhecidas (ou relembrando acontecimentos). Geralmente não passam por uma análise racional cuidadosa, sendo assim aceitos como pensamentos verdadeiros, mesmo que não o sejam, e deixam como marca a emoção gerada anteriormente.
Por exemplo: fui num restaurante no almoço e comi além da saciedade --> pensamentos: “estraguei meu dia, sou um fracasso, por isso meu peso só aumenta” --> sentimentos: culpa, fracasso, falta de força de vontade --> comportamento: para anestesiar ou não entrar em contato com o sentimento de culpa, acabo comendo ainda mais ao longo do dia.
Além disso, segundo Tribole e Resch (2012), quando os pensamentos sobre comida são irracionais ou distorcidos, os sentimentos negativos (como culpa, sensação de fracasso, falta de força de vontade) tendem a aumentar exponencialmente.
Os pensamentos automáticos são estudados pela Psicologia Positiva e pela Terapia Cognitivo Comportamental. As autoras Evelyn Tribole e Elyse Resch apresentam vários tipos de pensamentos negativos relacionados à alimentação, que são frequentes para quem faz dieta. Trago abaixo o mais clássico deles, bem como maneiras/sugestões para reformulá-lo:
Pensamento dicotômico (também chamado de tudo-ou-nada): tendência a ver a situação sob apenas duas categorias/alternativas (Beck, 2007). É aquela ideia do 8 ou 80, preto ou branco, tudo ou nada. Exemplo: “açúcar faz mal para a saúde, vou cortá-lo definitivamente”.
Situação: você está numa dieta restritiva há semanas, e o açúcar está proibido. Decide almoçar com a sua avó, que não vê há muito tempo. Sente o cheiro de bolo de chocolate já na chegada.
Pensamentos: “eu adoraria provar esse bolo, mas não posso, de jeito algum. Se eu comer uma fatia desse bolo, vou estragar toda a minha dieta. Acho que se começar, não sou capaz de parar de comer. Mas, pensando bem, acho que é ok tentar comer só um pedacinho pequeno”. Depois de comer um pedaço: “ai, não! Eu não deveria ter feito isso. Não tenho mesmo força de vontade. A culpa é minha por não conseguir emagrecer nunca ”.
Sentimentos: culpa, tristeza, fracasso, medo das futuras privações e de ganhar peso, desespero.
Comportamentos: você come um segundo pedaço, pois já “colocou tudo a perder”. Você tenta não entrar em contato com esses sentimentos negativos, ou, como forma de se punir, acaba comendo outros três pedaços.
Reformulando os pensamentos: que tal se manter no cinza, sem extremismos? Deixe o julgamento de que um alimento é COMPLETAMENTE bom ou ruim, porque, na verdade, isso vai depender da quantidade que você come, de quando, do seu apetite, das suas emoções e necessidades do momento. O equilíbrio não reside em se restringir e depois exagerar, que é o ciclo 8 ou 80 que normalmente ocorre na dieta.
Na verdade, na maior parte do tempo, nós mal estamos conscientes da chegada desses pensamentos. Quando estivermos conscientes, é válido fazer uma checagem: o que é verdade sobre esse pensamento? (Tribole e Resch, 2012)
Ok, isso exige treino e pode não parecer tão simples. Mas é importante estarmos atentos ao fato de que nem sempre os nossos pensamentos correspondem à realidade. Distinguir pensamentos de fatos pode ficar ainda mais difícil se você estiver preso à mentalidade de dieta.
Procure um psicólogo e um nutricionista comportamental se avaliar que precisa de ajuda na identificação e reformulação desses pensamentos (esse texto, como qualquer outro publicado nesse portal, não substitui um acompanhamento profissional). A prática de Mindfulness (sobre a qual já falamos aqui e aqui) também pode auxiliar na observação dos pensamentos, fazendo com que você encare as situações com atitude de abertura e curiosidade.
Para finalizar, voltemos às afirmações do início do texto: “Já sei que quando vou àquele rodízio, eu como até passar mal”; “Se eu tiver uma barra de chocolate em casa, com certeza eu vou querer comer inteira, de uma vez só”. Proponho um exercício de auto-observação. Que sentimentos ou emoções vem à tona quando você tem esses pensamentos? Será mesmo que toda experiência já vivida necessariamente se repete numa situação posterior semelhante?
Referências:
ALVARENGA, M. et al. Nutrição Comportamental. Barueri, SP. Manole, 2015
BECK, J. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. Porto Alegre, RS. Artmed, 2007.
TRIBOLE, E., RESCH, E. Intuitive Eating: A Revolutionary Program That Works. St Martins Press. 2012
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